Talvez eu procure algo realmente sem sentido, que na verdade só crio para estar atrás de algo. De tanto procurar, às vezes acabo encontrando, fruto da incerteza. E isso me atinge da pior maneira, como soco no estômago ou simplesmente dor certeira. Traçado o roteiro, após doses cavalares do encontro, bato a porta que me separa do ambiente feito de quatro paredes e do céu. Peço perdão pelo mau funcionamento de meu corpo a esmo e encontro uma cachaça na porta de casa. Segundos antes de segurar a garrafa brilhante, alguém a pega rapidamente:
- Achou que eu tinha esquecido do nosso dia?
Helena antecipou a noite que iríamos ter. Ela sabia que minha teimosia a faria gastar algumas horas pra me convencer. E eu não a queria agora, a garrafa já bastava. Teimei e acreditava na minha posição. Socaria a cara de Helena quantas vezes fossem necessárias para conseguir tomar aquela cachaça. A deriva, talvez encontrasse algo que fugiria do encontro que tive dentro de casa. Insaciável é Helena, idealizadora de futuros falsos, preocupada em fazer sempre o bem, principalmente para mim. E o que há de se fazer? Do outro lado da mesma moeda, insisto em procurar buracos.
- Hoje não dá. Quero sair por aí, talvez te encontrar!
- Querido, eu estou aqui...
- Sempre querendo me entender, hein Helena.
- Tá tudo bem?
- Sempre está, Helena, sempre está.
Se não encontro, tento cavá-los. Ela nunca entendeu, apesar de fingir querer fazê-lo.
- Até amanhã!
- Mas a gente nem começou. Vamos, me dê uma chance, a noite vai ser boa aqui...
- Com certeza vai ser...tchau!
- Querido! Volta aqui!
É inevitável que ela não entenda e por isso eu fujo. Pego a cachaça e saio correndo até o próximo quarteirão, pois a partir desse ponto Helena não tem mais poder. A procura é por algo metafísico, e é evidente minha preocupação em comê-lo cru, em estado puro, na escuridão que só a solidão pode proporcionar. E a diferença entre procura mental e procura física reside apenas no movimento que cada uma faz em seu eixo, egoísmo intelectual e apreço pelas aparências. Enquanto meu cérebro insiste em dar voltas, meus pés caminham para alguma direção que não tem fim.
Meu passo diminui com o passar dos quarteirões, as luzes seguindo um padrão de posicionamento certeiro e o peso de meus pensamentos afunda-me na calçada. Qual é o valor com que encaro os efeitos causados pela minha âncora mental?
Meus olhos gostam de correr o risco. Meus músculos não. Minha visão fotografa um casal seminu perto da entrada de uma entrada sem saída, próxima de uma boate perto de casa. Acredito que o sexo foi a única coisa que sobrou para fazerem, já que para eles trocar algumas frases, ou até poucas palavras seria inconveniente para ambos. Ele supõe que ela cansou de ouvir, e ela não agüenta mais não escutar nada dele, e por isso ela aceita o sexo como único maneira de fazê-lo falar, nem que seja por gemidos inconscientes. Tudo é negociável quando não se negocia.
Logo um bar surge, perto da boate, que naquele momento não ficava mais perto de casa. E eu culpo a garrafa. Carlos, acompanhado de mais uns amigos, me chama para uns drinques perto da porta de entrada do bar. Educadamente, com a gravata toda amarrotada e a camisa suada, exige que eu sente com seus amigos. Penso longos segundos. Faça um longo discurso para quem quiser ouvir e decido sentar e ficar. Já estava cansado demais pra continuar divagando.
E acredito que Helena ainda esteja me esperando na porta de casa. É sempre bom ter um porto seguro, onde minha âncora não sofra retaliações. Afinal, Helena só quer me entender.
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