quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Olhe vagamente a parede - Direto de 2006 (Parte 03)


Estávamos viajando pelo estado do Espírito Santo. Eu apenas ia aonde deveria ir, onde me diziam pra ir. Nada me desagradava. Os hotéis, em sua maioria, 3 estrelas, não atendiam as exigências ególatras do resto do grupo. Em um desses hotéis, enquanto eles quebravam as camas, eu jurei ver peixes-espadas na parede do banheiro. Depois da visão, me joguei no chão e escutei um barulho de vidro que parecia vir do quarto ou algo do gênero.
O que mais me deixava intrigado era que, em vez deles saírem do quarto e pedirem para ir para outro hotel, eles simplesmente destruíam o lugar em que nos hospedavam. Nunca tive problemas com isso. Tanto com os quartos ou com a banda. Simplesmente fazia meus solos e eles aprovavam. Nos ensaios era sempre assim. Logo depois do sinal de dedo polegar pra cima, eles voltavam para seu estado de transe musical. Continha meus risos. Ei, eu não tinha culpa. Claro que gostava do som, mas não conseguia me entregar como eles faziam.
Já o público parecia gostar dos shows. Tudo o que eu via eram peixes-espadas pulando loucamente no teto. Ou queria ver. Em um dos shows pelo estado, estávamos tocando nossa quinta música, pouco conhecida pelo grande público, e antes do meu solo, eu desmaiei. Caí na direção dos fãs e eles me seguraram. Uma parede humana amortecera minha queda.
No hospital escutei as palavras “para sempre”. Por favor, não pense que usava drogas. Eu era usado por elas por um propósito. Só não lembro mais qual era.
Hoje, preso nesse quarto de asilo e olhando a parede que fica do lado de minha cama, eu recordo, e agora compreendo, nessas linhas o que sobrou na parede da minha memória. O “para sempre” do doutor tinha relação com a banda. Por isso, desde aquele dia a banda tinha acabado. E desde aquele dia, nunca mais encontrei ou ouvi falar dos outros integrantes. Devem estar quebrando quartos de asilo, enquanto eu olho vagamente paredes.

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